Parceria entre
o governo e sociedade viabiliza construção
"Nenhum calçadão no mundo é de uso exclusivo
de pedestres"
"Desenvolver
uma obra com mais de cem clientes não foi nada fácil,
mas certamente foi muito gratificante". Dessa forma a arquiteta
Valéria Valadão descreve as características
do trabalho de reforma e ampliação do calçadão
de Ribeirão Preto, que teve os dois primeiros trechos entregues
em setembro.
Situada
no interior do Estado de São Paulo, a cidade de Ribeirão
Preto é considerada uma das mais desenvolvidas do país,
também chamada de "Califórnia Brasileira".
A área do calçadão do centro, no eixo da praça
15 de Novembro, é um dos pontos mais conhecidos da cidade,
e tem importância histórica, sendo inclusive tombada
pelo Condephaat.
As discussões sobre a reforma do calçadão começaram
há cinco anos, mas só se efetivaram na forma de um
convênio assinado em maio de 2000, envolvendo a Prefeitura
da cidade e a iniciativa privada, ou seja, os 124 proprietários
de imóveis (residenciais e comerciais) da área do
calçadão, representados pela Associação
Comercial e Industrial (ACI) de Ribeirão Preto.
"Pela
lei, a Associação teria a incumbência da administração
da obra, o que possibilitou uma sensível redução
de custos, tendo em vista a desobrigação de se efetivar
licitação e todo aquele trâmite burocrático
que só encarece o custo final", esclarece a arquiteta.
O principal problema para a definição do tipo de piso
eram as características da área: tráfego intenso
de automóveis, tanto leves (existem edifícios residenciais
com garagem no calçadão) quanto pesados (carros-fortes,
caminhões de carga e descarga e policiamento motorizado).
Segundo a arquiteta, os clientes queriam que o piso tivesse uma
qualidade estética que tornasse o ambiente mais "clean",
colorido e agradável, que desse uma personalidade totalmente
diferenciada à área.
"Não
dava para errar, por causa dos problemas já ocorridos com
o piso anterior e nenhum calçadão no mundo é
de uso exclusivo de pedestres. Então, eu optei pelo pavimento
de concreto estruturalmente armado com telas soldadas e acabamento
decorativo, para obter o efeito estético esperado",
comenta Valéria Valadão.
Os resultados com o emprego das telas soldadas em termos de economia,
rapidez e segurança foram potencializados pelo fato de o
cálculo estrutural ter sido feito já pensando no uso
de armadura com telas.
Durante
a intensa pesquisa para definição do piso, a arquiteta
acessou o site da ABRASPE - Associação Brasileira
de Pedestres, que apresenta dados interessantes sobre áreas
públicas para pedestres transitarem no mundo inteiro. Um
dos destaques era o piso das áreas destinadas à Vila
Olímpica de Sidney, na Austrália. Na busca por mais
informações acabou conhecendo o Stencil, uma tecnologia
australiana que está sendo exportada para o mundo todo. "Descobri
um representante no município de São José dos
Campos (SP), a Concrecor. Para minha surpresa, realmente o piso
atendia a uma série de requisitos muito interessantes, como
apresentar abrasividade, não ser escorregadio mesmo molhado
e ter um sistema de confecção muito rápido".
O
Stencil é um baixo relevo que permite total liberdade na
criação de desenhos exclusivos. O processo de execução
consiste em um rolo de papelão plastificado, com o molde
do desenho que se quer. Ele é desenrolado rapidamente sobre
o concreto lançado e desempenado. Passa-se uma espécie
de rodo sobre o molde para que ele afunde sobre o concreto e são
jogados os pigmentos para colorir o concreto. Esse pigmento só
vai colorir as áreas não cobertas pelo molde, entrando
cerca de 0,5 cm na camada de concreto, garantindo a qualidade da
coloração por muitos anos.
O
pavimento ficou com 12 cm de espessura, executado sobre sub-base
granular (bica corrida) e lona plástica impermeabilizante.
No acabamento, o piso recebeu um cristalizante de superfície
e um selante semi-brilho. O concreto do piso apresenta especificação
de fck de 28 MPa. Foram utilizados nos dois trechos já finalizados
cerca de 35 t de telas soldadas nervuradas, 11 t de espaçadores
soldados e 11 t de barras de transferência.
Entre
os bons resultados obtidos com a solução do piso em
concreto estruturalmente armado colorido, é possível
destacar a plasticidade oferecida pelo concreto em termos de textura
e acabamento, a rapidez de execução e o fato de tratar-se
de uma obra limpa, sem a necessidade de fechar a área tanto
para o comércio quanto para os moradores.
Para
a arquiteta Valéria Valadão essa construção
pode ser representativa de uma nova relação entre
governo e sociedade. "Eu acho que essa parceria, que acredito
seja inédita, já é um indício de um
novo relacionamento entre poder público e comunidade para
projetos públicos, permitindo que a sociedade atue como usuário,
cidadão e investidor. Com isso, as pessoas estabelecem uma
nova relação com o espaço público: se
ele investe, ele tem que tomar conta, não só da obra
em si, mas da utilização que se dará a essa
obra posteriormente. Prova disso é que outras cidades já
nos procuraram com o interesse de adotar prática semelhante
".
Os
dois primeiros trechos da obra, com 2.700 m2, forma realizados em
cerca de 60 dias, entre os meses de julho e setembro de 2002. A
extensão toda da área é de 10.800 m2, que compreendem
oito trechos. Em virtude do período de chuvas, os contratantes
decidiram que os trechos restantes deverão ser executados
no início do próximo ano.
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